Na Idade Média 95% da população era analfabeta e os vitrais funcionavam como uma verdadeira Bíblia em vidro
Quando se está diante da fachada da Catedral de Notre – Dame de Chartres não é preciso ser especialista em arquitetura medieval cristã para perceber que se trata de uma obra-prima. O interior da catedral é mais que isso. Passado o portal, a visão dos enormes vitrais que filtram a luz do Sol e a interpretam em todas as cores do arco-íris representa uma real imersão no mistério da espiritualidade cristã.
Construída entre os séculos 12 e 13, cada uma das suas nove portas de madeira, com frontões esculpidos, nos levam direto para os tempos medievais. Toda catedral digna desse nome é uma expressão em pedra da religião católica, mas Chartres é mais que isso: é um resumo de todas as igrejas através dos tempos. No alto da colina onde ela se situa, havia, em época pré-cristã, um importante templo pagão erigido pelos celtas.
No século 4, sobre as ruínas do templo pagão, foi erguido um dos primeiros templos cristãos. Sabe-se muito pouco sobre ele, da mesma forma que sobre a maioria dos lugares de culto dos primórdios do cristianismo. Sua existência e localização costumava ser cercada de segredo, devido às perseguições.
Apenas a partir do ano 312, o cristianismo se tornou religião oficial do Império Romano. Depois disso, no sítio de Chartres, várias outras construções se sucederam: houve uma igreja em estilo medieval carolíngeo, destruída pelos vikings em 858; uma outra em estilo românico, destruída em 1194 por um incêndio; até se chegar à catedral atual, em estilo gótico.
Chartres guarda vários relicários de santos e de grandes personagens da Igreja, inclusive o véu que, segundo se afirma, foi usado por Nossa Senhora no momento da Anunciação. Apesar desses tesouros, se a busca pessoal do visitante for por tranqüilidade, seu olhar irá seguramente convergir para os imensos vitrais. Eles contêm cerca de cinco mil figuras retratadas em 176 vitrais que cobrem uma área de 2.600 metros quadrados.
Os vitrais mais representativos são os das rosáceas da porta principal, que ilustram o Juízo Final, e o da capela norte, que representa a Glorificação de Nossa Senhora. A cor azul é onipresente nesses vitrais, mas trata-se de um azul especial, o azul da “Notre-Damede- la-Belle-Verrière”, cuja irradiante tonalidade celeste foi conseguida adicionando- se óxido de cobalto à pasta de vidro. A tonalidade é também conhecida como “azul de Chartres”.
Quando faltam as palavras, falam as imagens
Na Idade Média, quando 95% da população mundial era analfabeta, os vitrais funcionavam como livros. Na Catedral de Chartres, eles constituem uma verdadeira Bíblia em vidro. Mas Chartres não é famosa apenas pelos seus vitrais. Conta- se que outrora a porta sul da catedral só era aberta aos cavaleiros que alcançassem um elevado nível espiritual de conhecimento.
Ao entrar no templo, suas cabeças ficavam na altura dos pés da imagem de Cristo. Nesse ângulo de visão, a rosácea luminosa do vitral ao fundo parece flutuar ao redor dessa imagem de Jesus, conferindo a ela uma aura tremeluzente. Cristo cercado por uma mandala de luz multicolorida: uma visão de estontear.
É fácil, hoje, compreender por quais razões Chartres é considerado um lugar mágico e santificado. A catedral oferece aos olhos dos visitantes mais de quatro mil imagens e estátuas e muitas delas ainda não identificadas.
Fonte: revista planeta